sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Vida: exercício pêndulo da morte

Vida: exercício pêndulo da morte,
Fenda de escuridão e de abismo.
Terra dos loucos e subjectivismo
Do intenso, do fraco e do forte.

Somos estranhas anomalias da caverna
Taciturna e de prostituto soluço!
Somos a costura de rutilância e treva, avulso
E plasma para dar a dor eterna...

E a vida, com a lança escarlate sombria
Na gestação do ventre leva noite e dia
A harpa-da-treva irredutível!

E com astúcia espasmódica, mutilar
A mutação insondável secular,
Na fria dor da carne irretorquível!

Homem Subornado

Luxo, riqueza, supérfluo, provir
Prazeroso que homem afaga...
- Pompa, a fruta e a chaga
Para todos os dias, para todo o porvir...

Compremos, homem, a graça,
Compremos, homem, o ateísmo
E a incredulidade do iluminismo,
A ostentação e a desgraça!

Compremos tudo para o conforto.
Compremos também o crânio do morto.
Enquanto mais compramos o mundo,

A alma torna-se ainda mais imunda,
A fibra, a terra ainda mais moribunda,
E Deus ainda mais iracundo.

O Coveiro

Pálido coveiro de túmulos,
Nas covas que tu fizestes descansas
Os cadáveres impuros e as desesperanças
Sem conforto, e os profanados cúmulos.

Aí também descansa a agonia,
Homens, mulheres e crianças,
- Poetas e muitas lembranças
E o morto que tu enterrou ao meio-dia!

E nestas milhares de covas
Onde, tu, sempre vês lágrimas novas
Há de aumentar em ti a treva sedenta.

Mas, quando o teu último alento acabar
E o teu cérebro e o teu coração se esgotar,
Te enterrarão nesta mesma terra macilenta...

Inelutável

Vivemos neste círculo inenarrável
De sua podridão, encarcerados
Pelo pus de nossas chagas, ensanguentados
Pela treva desse mundo inelutável...

Oh, lágrima imundas que alaga
Nos túmulos, as tripas e os crânios
Engolidos pelos vãos subitânios,
E pela inevitável dor que nos apaga!

Chora, raio de pó inevitável!
Sofre, estéril massa inescusável!
(Cérebro carregado de agonias).

E nós, quanto mais infecundo somos,
O pecado nos torna ainda mais assomos
Do entulho de cadáveres de nossos dias!

Primeira Desgraça

Agora, homem dependente do despojo,
Torne-se a moldura de um podre sórdido,
E o coração de um pobre mórbido!,
Que da arrogância do teu nojo

Mil larvas te cubram o corpo...
Saibas que o reles que te afaga
È o mesmo que num soco te esmaga
E o enterra junto a outro morto!

Ah, ignorância! Ah, tempestade!
Que da própria mão nociva
Encheu a terra de maldade,

E a mácula agora não passa...
Que Eva, ao provar da maçã lasciva
Surgiu então a primeira desgraça!

Quando chegar o momento, saberás!

Quantos mijaram no teu copo de aniversário?
Quantos quebraram as tuas chaves de plástico?
Quantos acharam na confusão do teu afago implorado
Os escarros de uma perfídia que te jogou no escuro?

Que flores?
Que rosas?
Que céu?
Que pedra?

Quem apodreceu num arrepio os teus procedimentos?
Cerrou, acabou, morreu?

Em mil pecados escorreu
Seu dia frio,
Sua esperança escassa,
Seu fenecer bailado,
Seu jejum de uma gula,
Seu morrer mais cedo,
Sua larva amassada...

Quem passou te beijou?
Quem correu te viu?
Quem te viu te abraçou?
Quem irá colar no teu abraço uma esperança?

- Cai aqui dentro da poesia
E deixa os insetos mijar em teu corpo,
Deixa os camêlos defecar em tua lingua,
Deixa as aves bicar os teus olhos,
Deixa o pranto cuspir o teu coração podre!

Sem dizer nada,
Sem gemer,
Sem cansar,
Sem carinho,
Sem protesto,
Sem versos,
Sem luz,
Sem Poeta,
Sem nada!...